Pio XII, na solene beatificação de 8 de junho de 1952,
traçava o perfil de Bertília Boscardin, religiosa entre as mestras de santa
Dorotéia de Vicência, com estas palavras: “É uma humilde camponesa da nossa
bendita terra da Itália. Figura puríssima de perfeição cristã, modelo de
recolhimento e de oração. Seu caminho, ‘a via das carroças’, a mais comum. Nada
de êxtase, nem de milagres em vida, mas união com Deus sempre mais profunda no
silêncio, no trabalho, na oração, na obediência. Dessa união vinha a delicada
caridade que ela revelava no trato com os enfermos, médicos, superiores, com
todos”. A “via das carroças”, isto é, o trabalho nos campos da planície vêneta,
que Ana Francisca (este é seu nome de batismo) percorria da primavera ao
outono, porque esta era a ocupação principal das meninas do campo, antes que
tantas pequenas indústrias lhe mudassem a fisionomia.
Ana Francisca, nascida em Gioia di Brendola, na província de
Vicência, dirigia-se ao campo ao raiar do sol e voltava para casa só ao
entardecer porque, como grande parte das meninas vênetas, durante o dia
trabalhava na fiação. É compreensível que a família não tenha demonstrado entu-
siasmo com sua escolha de vida e tenha retardado seu
ingresso no convento de Santa Dorotéia, aos pés do monte Berico.
De qualquer forma, ingressou ainda jovem e, mal emitira os
votos temporários, depois do noviciado, foi designada para o hospital de
Treviso, no qual prestou seu humilde e generoso serviço até a morte. Escolhia
os horários mais desgastantes, os da noite, para aliviar o fardo das co-irmãs.
Trabalhar e sofrer em silêncio — anotava em um caderninho — e deixar aos outros
as satisfações. Que satisfações poderia haver nas correrias de um hospital?
Era afeiçoada a seus enfermos e sofreu, sem demonstrar aos
outros, quando teve de transferir-se para Brianza, por causa do avanço das
tropas austríacas durante a Primeira Guerra Mundial. Então foi designada para a
lavanderia: “Estou contente”, anotou, “porque faço a vontade de Deus”.
Aos 22 anos foi-lhe extraído um tumor, mas voltou logo ao
trabalho habitual. Morreu depois de uma segunda intervenção cirúrgica, com
apenas 34 anos. João XXIII a incluiu no livro dos santos em 11 de maio de 1961.